quinta-feira, 1 de junho de 2017.
A Congregação da Ressurreição – Padres, Irmãos e leigos Ressurreicionistas – como todo instituto de vida consagrada, possui um carisma próprio de modo a vive-lo e atuá-lo na Igreja e no mundo. É deste carisma que brota e deve se desenvolver o apostolado do instituto. O carisma ressurreicionista parte da experiência pessoal e comunitária do Mistério Pascal de Cristo na Igreja, mediante os sacramentos da graça e a doutrina católica.
O carisma de um instituto é a herança que o fundador deixa a posteridade da comunidade por ele fundada. No caso dos ressurreicionistas, estes foram fundados por um leigo, de origem polonesa, chamado Deodato Janski que nasceu e viveu na primeira metade do século XIX. A fundação ocorreu em Paris e logo estabeleceu-se em Roma.
Deodato Janski na juventude se empenhara muito em causas sociais e nacionalistas devido à situação de sua terra natal e dos seus conterrâneos em terra estrangeira. Não obstante os ideais nobres de transformação da realidade a sua volta, o jovem Deodato andou errante. Abandonara a fé católica, frequentara diversas filosofias e seitas anticatólicas, e levara uma vida moral dissoluta.
É submergido nesta realidade de distância de Deus e da Igreja, de erros e de pecado que a Providência o encontrará e Deodato iniciará um caminho de conversão, penitência e busca de vida nova. Deodato faz a experiência do retorno à fé e descobre finalmente o que procurava às apalpadelas empenhando os anos de sua juventude na Igreja, nos sacramentos, de modo especial na confissão e na comunhão, e na doutrina católica.
É no Mistério Pascal que Deodato, e sucessivamente, os cofundadores Pe. Pedro Semenenko e Pe. Jeronimo Kajsziewicz, conseguirão expressar antes de tudo a própria experiência de conversão, retorno à fé e descoberta da própria vocação. De modo que, todo. apostolado foi se orientando na mesma direção, isto é, da ressurreição pessoal para a ressurreição da sociedade. Em outras palavras, a sociedade nova só será possível a partir de homens novos.
O Mistério Pascal de Cristo envolve sua Paixão, Morte e Ressurreição, do qual cada batizado é chamado a participar por pura graça cooperando com a vontade e a liberdade. Essa participação traduzida de modo mais particular para a realidade da nova comunidade que surgia no seio da Igreja em meados do século XIX se daria pela morte para o pecado, para os vícios, para o erro e para si mesmo, para ressuscitar, com Cristo na Igreja, para uma vida nova de conversão, penitência e santificação pessoal e comunitária.
A finalidade do apostolado educacional é o pleno desenvolvimento da pessoa humana.”
Logo o jovem fundador entendeu a imensidão deste carisma no campo apostólico: pessoas unidas neste mesmo ideal vivendo em comunidade; inseridos numa paróquia a fim de torna-la lugar fecundo de ressurreição pessoal e social; e mais, numa ação educativa através de escolas, grupos de estudos, conferencias, etc; num esforço missionário voltado aos meios de comunicação social, naquele tempo jornais e revistas; enfim, em cada lugar onde se fizesse necessária a ressurreição da sociedade e se pudesse começar pela pessoa, lá poderia se delinear o apostolado ressurreicionista.
Se podemos então definir uma linha mestra da pedagogia ressurreicionista é esta: acreditar que a ressurreição da sociedade é possível de um lado graças ao amor incondicional de Deus pelo homem – começando pela certeza do próprio ressurreicionista a este respeito –, depois de que acreditar que é possível ao homem fazer a experiencia contínua do Mistério Pascal na própria vida.
Assim sendo, o objetivo da pedagogia ressurreicionista insere-se no objetivo geral da Congregação que é a ressurreição da sociedade através da Igreja nos seus sacramentos e sua doutrina. A partir daí a Congregação sintetizou seu ideal formativo do seguinte modo: “A finalidade do apostolado educacional é o pleno desenvolvimento da pessoa humana. Este objetivo realiza-se pela formação do intelecto e do devido juízo, para levar as pessoas a Deus, que é fonte de toda sabedoria e conhecimento. (...) deve inculcar nas pessoas o valor da própria dignidade, liberdade e missão e criar entre elas uma comunidade vivificada pelo espírito do Cristo Ressuscitado. (...) devem reunir os valores intelectuais e os espirituais” .
No contexto pedagógico ressurreicionista, que é aquele católico, deve se “nutrir profundo amor e respeito pela verdade” ; e que “o senso da dignidade pessoal deriva do fato da criação, redenção e do chamado do homem para a união com Deus” . Cuidado especial terá em preparar a pessoa para que contribua para a ressurreição da sociedade. A escola ressurreicionista deverá ser uma autentica comunidade de fé, uma experiencia autêntica de vida cristã, adoração, amizade e mútua aceitação; além de ser lugar onde se aprofunde a tradição cristã e cultural da sociedade onde está inserida .
A ação pedagógica ressurreicionista deve basear-se em realidades chaves e inegociáveis para a concepção cristã do homem. Além do que deverá “criar uma atmosfera de liberdade e responsabilidade, mantendo a disciplina necessária para se atingir os ideais da comunidade. (...) manter o necessário e fundamental respeito pela integridade e individualidade dos alunos e educadores” . Além do que ao que compete aos educadores, estes devem ser profissionalmente competentes de modo a alcançar os objetivos educacionais ressurreicionistas . Competência esta que deve ser constantemente renovada e aperfeiçoada. Tudo em vista daqueles que foram confiados aos seus cuidados.
O que foi dito até aqui, no decorrer da quase bicentenária história da Congregação da Ressurreição, encontra raízes em alguns experimentos pedagógicos a partir da segunda metade do século XIX, cada qual conforme a situação histórica e geográfica onde se dava. Podemos destacar três: Pe. Ludovico Funcken, CR, no Colégio Sant’Ágata, no Canadá; Pe. Paulo Smolikowski, CR, em Leopoli, na Ucrânia; e Pe. Valeriano Kalinka, CR, em Adrianápolis – onde mais tarde contará também com o apoio de Pe. Paulo Smolikowiski.
Pe. Ludovico Funcken defendia a criteriosa seleção do conteúdo e do material didático, pois este não devia fazer violência ao educando em sua idade, assim como não podia atraí-lo ou despertar curiosidade para o mal. A fé fomentada pelo ensino religioso deveria fazer a síntese inteligível, segundo o apotegma anselmiano: credo ut intelligam – creio para entender. E do mesmo modo deviam desenvolver-se simultaneamente coração e inteligência. No seu sistema educativo a História universal não era dissociada da História da Igreja. Juntamente ao que privilegiava o influxo do bom exemplo da parte dos educadores. A liberdade e a autonomia eram elementos chaves, mas sempre iluminadas pela inteligência e o senso do dever. Dizia: “Deixai a cada um o seu caráter, mas purificai-o”. Pe. Ludovico considerava o Colégio que fundou e estava sob sua direção como parte da sua vocação .
Um dos elementos didáticos privilegiados pelo Pe. Paulo Smolikowiski era o uso de contar histórias a fim de contribuir para os alunos desenvolverem o senso moral. Podiam ser histórias dos santos, de algum personagem histórico ou acontecimento de onde pudesse extrair um ensinamento para a vida. A propósito das despesas com um colégio disse: “Nós não educamos por dinheiro, mas por Deus, só por Deus”. Colocando assim o fundamento do apostolado educativo: o amor de Deus pelos homens. De onde tirou uma de suas máximas quanto a postura do educador em não querer atrair a todo custo o amor dos alunos, mas apenas cumprir com a sua missão de educador .
De Pe. Valeriano Kalinka se pode extrair o seguinte quanto a ação pedagógica ressurreicionista: se deve educar para o dever; para que os educandos ajam segundo a voz da consciência; para que tenham certa autonomia; em razão disto punir raramente, mas perdoar frequentemente; advertir sempre os alunos para que sejam homens virtuosos, bons católicos e uteis cidadãos; os educadores devem buscar a colaboração dos alunos e despertar uma relação de confiança; e não deixar que jamais fiquem sem ocupação, até mesmo no lazer. Dizia: “devemos conquistar a obediência dos alunos inspirando para conosco a confiança”. Além do que estar sempre presente entre os alunos .
Havia uma visão conjunta dos três grandes educadores ressurreicionistas: é aquela a respeito da condição do homem diante de Deus e em relação a si mesmo e sua necessidade da graça e da verdade. “O bem para firmar raízes numa alma mesmo se inocente – mas sempre corrompida pelo pecado original – precisa passar antes pela luta e deve firmar-se na alma com plena consciência”.
“Educar quer dizer perfeicionar no homem sua vontade, formar nele o caráter.”
Educar, portanto, “não quer dizer somente ensinar ou acostumar ao bem, porque não se trata de um animal, mas de um homem, e o homem não pode ser educado sem ele próprio, porque nele tudo depende da livre vontade. Educar quer dizer perfeicionar no homem sua vontade, formar nele o caráter. (...) A criança que é sempre levada nos braços, quando é deixada, logo chora e por si mesma não caminhará. E tanto mais facilmente se deixará guiar por qualquer um que seja, e dado o estado da sociedade de hoje, será levada pelo mau caminho” – dizia Pe. Kalinka em 1858 .
Podemos dizer, portanto que o modelo pedagógico ressurreicionista, inteiramente apoiado na concepção católica do homem e da educação, é um modelo baseado na formação da consciência, onde os alunos devem ser guiados pelo sentido do dever, e mais, por convicção. Em vista disto, vontade e liberdade devem ser devidamente orientadas. Pe. Smolikowiski dizia: “Não é razoável reprimir nos meninos aquelas manifestações de ideias e tendências que marcam o rápido desenvolvimento natural de suas personalidades. Basta dizer-lhes e colocar-lhes ao alcance das aspirações um alimento são .
Este alimento não é outro que a educação autenticamente católica. A Congregação da Ressurreição possui um moto que ajuda a definir os rumos do apostolado educacional: Veritate et Caritate. Isto quer dizer que a ação educativa, enquanto obra de verdadeira caridade, isto é, de amor a Deus e ao próximo, deve estar imbuída do sentido da verdade. Este sentido norteará a concepção do homem e da própria educação; além do que não descuidará nem prescindirá da dimensão religiosa; e, por fim, mas não menos importante, será o critério decisivo na escolha dos meios e seleção de conteúdos. Deste modo, será uma ação pedagógica que contemplará a educação, o educando e o educador naquilo que é próprio de cada um. Terá por prioridade a formação intelectual e jamais dissociada das dimensões religiosa, afetiva e social. Tudo isso visando, conforme cada idade e realidade, formar a consciência do educando mediante a vontade e a liberdade, de modo que ele se torne homem novo para uma sociedade nova. E consequentemente também este agente de transformação da sociedade.
Referências
- CONGREGAÇÃO DA RESSURREIÇÃO. Constituições. Art. 201.
- Ibid. Art. 202.
- Ibid. Art. 203.
- Ibid. Art. 204.
- Ibid. Art. 205.
- Ibid. Art. 207.
- Ibid. Art. 202.
- MUSTAL. L. Il problema dela Pedagogia CR. Romae: Archivum CR. p.13-26.
- Ibid. p. 27-34.
- Ibid. p. 35-49.
- Ibid. p. 40.
- Ibid. p. 46.