segunda-feira, 1 de maio de 2017.

Toda concepção de educação e projeto pedagógico parte de uma determinada visão do homem e do mundo . Por isso é correto dizer que o engenheiro da educação é o filósofo e não o pedagogo. E igualmente constatar que se algo não vai bem com a educação é porque algo não funcionou bem

com o pensamento acerca do homem e do mundo, seja desvirtuando-se da verdade das coisas, seja por ideologização intencional por interesses diversos.

A filosofia da educação católica parte de dois pressupostos que, cada qual ao seu modo, conduz a verdades universalmente válidas e aceitáveis ; estes são a fé e a razão. A fé partindo dos conteúdos da verdade revelada chega a uma concepção acerca do homem e do mundo universalmente válida. E igualmente a razão se se deixa guiar pela retidão no pensar chegará as mesmas concepções. Porém a razão de sua parte carecerá de maiores luzes, que serão dadas pela fé. E a fé de sua parte poderá ser melhor expressa e aprofundada pela razão – o encontro do Evangelho com a filosofia grega é prova

histórica e belíssima disto. – É deste processo que a filosofia da educação católica extrai o substrato: uma reflexão do homem, do mundo e da própria educação iluminada pela razão e pela fé, para daí formular sua pedagogia.

“... a educação católica vê neste mesmo homem uma criatura amada por Deus em si mesma”

A educação católica se orienta por um modo privilegiado de olhar para o homem e para o mundo. E não se trata de mais uma opção entre tantas válidas, mas a que melhor oferece respostas e luzes a fim de se delinear um ideal pedagógico singular, suficiente e eficaz. Porque ela além de apoiar-se no ideal da realização do homem sábio, formando o homem para o que tem de mais nobre que é o intelecto – o homem é antes de tudo, até mesmo da práxis, um ser pensante – a educação católica vê neste mesmo homem uma criatura amada por Deus em si mesma, alguém que vale o precioso Sangue de Cristo e que pelo batismo torna-se filho de Deus e templo do Espírito Santo . Altíssima, portanto é a dignidade, de modo especial, de um educando, quando falamos de reflexão e ação pedagógicas .

É claro que se tratando de questões relacionadas a prática organizacional escolar, como por exemplo, a grade curricular, a escola católica segue a legislação vigente . A escola católica não se subtrai as leis do Estado para a educação – desde que não sejam iniquas , como é o ensino da ideologia do gênero. Mas existem diferenciais que como linhas mestras orientam todo o resto, como é o caso da primazia do intelecto, a busca da excelência e a experiencia religiosa como elemento fundamental e inegociável. Assim sendo, além daquelas disciplinas que são clássicas e obrigatórias, haverá outras que contribuam para o alcance do ideal educativo católico, como é o caso do ensino religioso, da filosofia, da verdadeira arte, e inclusive o catecismo , além do que a História da Igreja e o acompanhamento vocacional – tudo isso será organizado fora do período das disciplinas clássicas.

“Na complexa vida escolar, a escola católica, perfeitamente afim às outras escolas, difere delas num ponto substancial: ela está apoiada no Evangelho do qual colhe a inspiração e a força” . Podemos traçar um percurso em três palavras-chaves que ajudam a compreender o ideal educativo católico e seu diferencial. São elas: a sabedoria, a ascese e a graça.

A SABEDORIA

O ideal clássico da educação católica é formar o homem sábio; e isto não exclui per se ipso as outras dimensões inerentes a constituição humana, muito ao contrário, será o intelecto a ordenar e nortear as demais dimensões da vida humana . Assim sendo o ideal pedagógico católico é apresentar a verdade e auxiliar na sua busca por um caminho de retidão lógica, mas também em virtude da fé; é formar para a liberdade na sua verdade e significado; e igualmente o valor da consciência reta e esclarecida na verdade e na liberdade. A reflexão dos transcendentais da bondade, da beleza e da verdade muito ajudará na busca da sabedoria.

Partindo do ideal da formação do homem sábio e também o homem novo, a escola católica deverá ter antes de tudo a consciência de exercer um verdadeiro dever apostólico e cívico . Deverá seguir um programa racionalmente ordenado – Ratio Studiorum – levando em conta a pedagogia de cada idade, utilizando-se dos avanços das ciências humanas , mas não sem uma profunda visão crítica alicerçada

nos fundamentos da visão católica a respeito do ser humano e do mundo. Sobre a escola católica e o primor pelo intelecto dirá o Direito da Igreja: “O ensino que nelas se ministra seja notável pelo aspecto científico, ao menos do mesmo nível das outras escolas da região” .Em outras palavras seja diferenciado pela qualidade e excelência do ensino.

Deverá ainda, entre outras coisas, ter clareza da própria identidade e missão ; salvaguardar a identidade cristã perante a sociedade ; resistir ao relativismo enfraquecedor ; ser lugar privilegiado de promoção integral mediante o encontro vivo e vital com o patrimônio cultural e científico de modo sistemático e crítico ; partir portanto de um projeto educativo intencionalmente dirigido à promoção total da pessoa capaz de formar personalidades fortes e responsáveis, capazes de opções livres e acertadas . A escola católica é consciente do ensino da doutrina evangélica como é transmitida pela Igreja Católica .

A ASCESE

A concepção católica acerca do homem é que este é revestido de um valor inestimável pelo que é em si mesmo. Mas esta mesma natureza humana revestida de alta dignidade é ferida e marcada pelo pecado, tanto original quanto atual. Este homem precisa, portanto, tomar consciência de quem é a partir destes pressupostos: sua dignidade e ao mesmo tempo como as coisas se tornaram mais exigentes e difíceis em razão do pecado. A educação tem papel fundamental não só na tomda de consciência, mas na proposta da direção a seguir assim como os meios para seguir.

Por isso um plano pedagógico católico entre outras coisas prevê a modo de ação elementos como o esforço, a disciplina, o trabalho e o sacrifício, numa palavra, a ascese .

Pois o desenvolvimento do intelecto, mas também das outras dimensões da vida humana tem uma direção a seguir, como a planta em direção ao sol, porém o ser humano em direção a verdade e ao bem. Portanto é preciso ser bastante realista e não cair no conto de que a educação e o aprendizado sejam apenas algo prazeroso, porque não será sempre assim, ela denota ascese. E todos os envolvidos no processo educativo precisam estar a par disso. O que trará felicidade serão as consequências de tal esforço, assim como o progresso na verdade e no bem.

“...ser livre é conhecer o bem, praticá-lo e nele crescer e isto denota consciência, responsabilidade e decisão.”

Aqui podemos falar de três aspectos da educação católica e que até mesmo como sistemas pedagógicos se complementam e muito nos ajudam a entender esta realidade da ascese, assim como orientar melhor a ação educativa. O primeiro e muitíssimo conhecido é o sistema preventivo, que em poucas palavras significa o seguinte: evitar o mal, mas não só, é preciso fazer o bem. Depois de que é preciso crescer no bem, aí surge um segundo aspecto, que é a educação para as virtudes, do momento que conhecido o bem é preciso progredir e consolidar a sua prática. E, por fim, um sistema que leva em conta a educação para a autêntica liberdade, pressupondo evidentemente saber que ser livre é conhecer o bem, praticá-lo e nele crescer e isto denota consciência, responsabilidade e decisão. É neste último caminho pedagógico que se situa a pedagogia ressurreicionista: conhecer o bem e livremente praticá-lo .

A GRAÇA

É a carta de ouro na manga da educação católica, porque o mesmo homem que conhece o bem e deseja, com esforço, praticá-lo, tão logo se dá conta de que ainda assim se torna muito difícil ir em tal direção por si só. Da conta de que carece de algo a mais: trata-se da graça. Que não deve confundir-se com o ensino religioso propriamente dito, mas da educação para a fé e pela fé. E aqui entram práticas como o ensino do catecismo, a preparação para os sacramentos, depois de que a frequência na confissão e na comunhão, a devoção católica, os sinais religiosos, a oração, etc. “Desde o primeiro dia da entrada numa escola católica, o aluno deve receber a impressão de encontrar-se num ambiente novo, iluminado pela luz da fé, com características originais” .

Não obstante a graça se faz necessária principalmente em razão do pecado que anuviando o intelecto e tornando fraca a vontade, tira a dignidade humana. Só Deus pode restabelecê-la; o homem não pode reerguer-se por si só. Por isso “na escola católica e, analogamente, em toda escola, Deus não pode ser o Grande-Ausente ou um intruso mal recebido” . E daí emana a responsabilidade impreterível de toda escola católica: esta deve trazer consigo simultaneamente a clareza de sua identidade e a coragem de arrostar com todas as consequências que derivam desta sua diferença .

Os experimentos pedagógicos ressurreicionistas dos quais se tem documentação, não obstante a variedade das práticas, possuem um fio condutor que é formar os estudantes para a autonomia, e isto significa: formação do intelecto e das demais dimensões humanas para o reto uso da liberdade.

Toda e qualquer instrução deve levar o educando a escolher fazer o que é correto porque tem condições de fazer isto sem imposição externa a não ser movido pela própria consciência formada na verdade, a fim de orientar à vontade e esclarecer a responsabilidade .

Assim sendo, a sabedoria, a ascese e a graça são elementos importantíssimos na pedagogia ressurreicionista, pois seu alicerce é católico. Haja vista a dinâmica pascal do carisma que orienta o objetivo do apostolado: a ressurreição da sociedade – formando para isto autênticos líderes para todos os campos da vida humana: profissional, social e espiritual . A graça eleva o intelecto, fortalece a vontade e consolida cada esforço na busca da verdade. Podemos dizer que o que dá o teor e o diferencial da educação católica é a graça e não sem a colaboração humana mediante o aprimoramento do intelecto pela busca da sabedoria e o esforço para empreender tal caminho, que é o caminho da realização humana.

Referências

  1. Serão utilizados como fontes: CONCÍLIO VATICANO II. Declaração Gravissimum Educationis (GE). Roma: 1965. E os Documentos pós-conciliares emitidos pela SAGRADA CONGREGAÇÃO PARA EDUCAÇÃO CATÓLICA (SCEC). A Escola Católica (EC). Roma: 1977; O leigo católico testemunha de fé na escola (O leigo católico). Roma: 1982; Dimensão Religiosa da Educação na Escola Católica (DR). Roma: 1988. Todos disponíveis em www.vatican.va.
  2. O leigo católico, nº 18.
  3. EC, nº 35.62.
  4. DR, nº 55.
  5. Ibid, nº 75.
  6. GE, nº 2.
  7. DR, nº 100.
  8. DR, nº 62; O leigo católico, nº 47..
  9. DR, nº 68-69.
  10. DR, nº 42.
  11. DR, nº 47.
  12. “A finalidade do apostolado educacional é o pleno desenvolvimento da pessoa humana. Este objetivo realiza-se pela formação do intelecto e do devido juízo, para levar as pessoas a Deus, que é a fonte de toda sabedoria e conhecimento. (...) No apostolado educacional (...) devem reunir os valores intelectuais e espirituais”. CONGREGAÇÃO DA RESSURREIÇÃO. Constituições. Art 201. Roma: 2001.
  13. O leigo católico, nº 16.
  14. EC, nº 4.
  15. “A atribuição das diversas responsabilidades é regulada pelo princípio de subsidiariedade, pelo qual a autoridade eclesiástica respeita em particular as competências profissionais próprias do ensino e da educação”. EC, nº 70.
  16. CÓDIGO DE DIREITO CANÔNICO. Do múnus de ensinar da Igreja. Livro III, título III, Cân. 806, § 2. Roma: 1983.
  17. Ibid, n° 6.
  18. Ibid, n° 11.
  19. Ibid, n° 12.
  20. Ibid, n° 26.
  21. Ibid, n° 29.
  22. Ibid, n° 31.
  23. Ibid, n° 49.
  24. “No quadro da vida escolar merece um aceno especial o trabalho intelectual do aluno. Este trabalho não se deve separar da vida cristã, entendida como adesão ao amor de Deus e cumprimento da sua vontade. A luz da fé cristã estimula a vontade de conhecer o universo criado por Deus. Acende o amor à verdade, que exclui a superficialidade no aprender e no julgar. Faz reviver o sentido crítico, que rejeita a aceitação ingénua de muitas afirmações. Orienta na ordem, no método, na precisão, sinais duma mente bem estruturada, que trabalha com sentido de responsabilidade. Sustenta o sacrifício e a perseverança, exigidos pelo trabalho intelectual. Nas horas de fadiga, o estudante cristão recorda a lei do Gênesis (Gn 3, 19: “Comerás o pão com o suor do teu rosto”) e o convite do Senhor (Lc 9, 23: “... tome a sua cruz cada dia”).” DR, nº 47.
  25. MUSTAL. L. CR. Il Problema dela Pedagogia CR. Roma: Archivum Generale, 1959.
  26. DR, nº 25.
  27. “O professor convida os alunos a examinar a própria consciência. Quem pode dizer-se verdadeiramente sem culpa? (cf Jo 8,7). Deste modo eles adquirem o sentido do pecado: o grande da humanidade e o pessoal, que cada um descobre em si mesmo. Pecado que é afastamento de Deus, rejeição da mensagem de Cristo, transgressão da sua lei de amor, traição da consciência, abuso do dom da liberdade, ofensa aos outros filhos de Deus, ferida na Igreja da qual somos membros”. DR, nº 92.
  28. DR, nº 51.
  29. EC, nº 70.
  30. CONGREGAÇÃO DA RESSURREIÇÃO. Esperimenti Pedagogici. Annali Risurresionisti. Anno I. Roma: Archivum Generale, 1900.
  31. CONGREGAÇÃO DA RESSURREIÇÃO. Op. cit.. Art 203. Roma.
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